Dispostos a entender a essência do comportamento do consumidor, os profissionais de marketing estão descendo às camadas mais profundas da mente humana, no conhecimento chamado de Neuromarketing. Utilizando novas tecnologias da medicina e da biologia, como a ressonância magnética e a tomografia computadorizada, os cientistas das vendas querem mapear como cada um dos nossos neurônios reage ao estímulo de uma marca, ao sabor de um refrigerante ou aos apelos de um simples outdoor na rua. A expectativa é de que, no futuro, as empresas consigam entender com um nível de detalhamento inédito quais são os fatores que desencadeiam toda a corrente de desejos, necessidades e anseios que leva uma pessoa a achar que vale a pena pagar um pouquinho mais por determinado produto.
O Neuromarketing é uma disciplina ainda nova e que, até agora, fez avanços muito sutis. Mesmo assim, a nova disciplina atrai o interesse dos profissionais da área de publicidade, comunicação e marketing. Com os equipamentos da medicina, os primeiros pesquisadores de Neuromarketing fotografaram o cérebro durante o processo de tomada de decisão. A partir daí, com base nos estudos que apontavam quais regiões do cérebro são responsáveis por determinadas funções (como emoção, racionalidade e memória), foi possível enxergar as funções cerebrais ativadas por determinado estímulo.
Por exemplo, um fabricante de automóveis poderá escanear o cérebro de um consumidor-cobaia para saber que tipo de relação as pessoas têm diante de um novo veículo – mais emotiva ou mais racional. Essas informações, acredita-se, poderão orientar campanhas publicitárias e estratégias de marketing mais eficazes. Mais do que isso, as pesquisas deverão servir de referência no desenvolvimento de futuros produtos. No momento em que as empresas souberem, com rigor científico, como criar mercadorias que despertem o desejo de consumo no ser humano, a garantia de retorno será total.
Agora, os profissionais do marketing têm a chance de observar as reações do cérebro em tempo real. No futuro, acreditam os estudiosos, em uma pesquisa qualitativa, será possível anotar as intenções inconscientes dos entrevistados em vez de simplesmente registrar as respostas objetivas, racionais – e nem sempre sinceras – de cada um deles.
Em outubro de 2004, o cientista norte-americano Read Montague, da Universidade de Baylor, no Texas, publicou um artigo na revista Neuron que, hoje, é citado por dez entre dez especialistas como a primeira experiência a aliar técnicas da neurociência com a mercadologia. Montague e sua equipe aplicaram uma série de testes num grupo de 67 pessoas. Num deles, o grupo bebeu amostras de Pepsi e Coca-Cola sem identificação. Diante da pergunta sobre qual era o melhor entre os dois refrigerantes, as pessoas não tiveram dúvida: apontaram os copos que continham Pepsi. Em outro teste, as bebidas foram devidamente identificadas e, dessa vez, Coca-Cola levou a preferência. Montague utilizou um equipamento de ressonância magnética para fotografar o cérebro dos consumidores durante a pesquisa. A conclusão do artigo, intitulado Neural Correlates of Behavioral Preference for Culturally Familiar Drinks (Correlações Neurais de Preferência Comportamental para Bebidas Culturalmente Familiares, em tradução livre), é de que partes diferentes do cérebro foram acionadas durante cada resposta. Quando os consumidores sabiam que estavam bebendo Coca, as funções mais racionais do cérebro eram ativadas, a partir de uma região chamada de córtex medial pré-frontal. Já quando bebiam Pepsi, sem identificação do produto, eram despertadas as partes ligadas ao controle da satisfação e do prazer – geralmente associadas ao que, na medicina, chama-se putâmen. A grande descoberta do experimento é a prova de que marcas têm, de fato, um poder profundo sobre a mente dos consumidores. Um poder biológico, por assim dizer. A sensação dos especialistas quando tiveram em mãos a pesquisa é de que foi dado um passo importante para a descoberta do caminho que leva ao obscuro universo das decisões irracionais do ser humano.
A ciência já havia sido aplicada pela propaganda na criação de sensores para acompanhar o movimento dos olhos, monitorando os movimentos que a pupila percorria diante de uma imagem. Assim, os designers descobriram como posicionar um anúncio, por exemplo, ou torná-lo mais atraente. De acordo com um estudo do Online Journalism Review (entidade que publica recomendações sobre como organizar informações em sites de notícias), quando olham uma foto de uma pessoa em um site, as mulheres concentram seus olhos no rosto do fotografado. Os homens olham para o rosto, mas também se fixam na região genital. Fazem isso também quando a foto não é de um ser humano, mas de um animal.
Independentemente do espaço que o inconsciente ocupa, está claro que a tarefa dos “neuromarqueteiros” é enorme. Não é descobrindo onde está o neurônio que a gente vai saber onde ocorre a decisão, simplesmente porque não existe o neurônio da decisão; o processo de escolha do ser humano ocorre de forma integrada. No sonho dos profissionais de marketing mais ousados, o cérebro humano viria equipado com um botão de compra. Encontrando o botão e descobrindo como acioná-lo, o consumidor apenas obedeceria à ação. No entanto, essa é uma visão demasiadamente simplista da mente. O que existem são vários “botões” encadeados, mas que não têm uma localização específica no cérebro. Ninguém sabe onde está o pensamento.
A Thinking Craft, Inc. é uma empresa que nos EUA desenvolveu a tecnologia Neurographix, que permite segmentar o mercado com base em como as pessoas pensam. Baseada em 25 anos de estudos científicos, inicialmente voltados à melhoria do aprendizado, foi desenvolvido um sistema para classificar os padrões de pensamento que se dividem em quatro. Cada padrão é baseado na dominância do lado direito ou esquerdo do cérebro e tendências abstratas e concretas. Assim, é possível uma empresa oferecer aos seus clientes um questionário em troca de um relatório para mais tarde personalizar sua comunicação (scripts de telemarketing, e-mails, anúncios, etc). A empresa acumula hoje um banco de dados gigantesco para cruzamento com o de seus clientes. Num futuro não tão distante, as empresas poderão dizer precisamente se uma campanha publicitária ou produto aciona a atividade cerebral e neuroquímica associada com memória e ação.
Sem descobrir onde fica o “botão de compra”, o Neuromarketing está limitado a colher informações científicas para ajudar no desenvolvimento de campanhas, por exemplo. O conceito pretende transformar o subjetivo em racional e mensurável. No desafio de colher novas informações sobre o comportamento do consumidor, os profissionais devem ser cautelosos. Pesquisas qualitativas e quantitativas de opinião já produzem um emaranhado de porcentagens e conceitos que, muitas vezes, as empresas são incapazes de interpretar. Como será o dia em que os executivos passarem a exibir chapas de cérebros humanos nas apresentações de diretoria?
As neurociências ainda estão redefinindo os padrões estéticos já formulados há milênios. A Medida de Ouro, ou Progressão de Fibonacci, ou mesmo Phi, é usado como referência a físicos, biólogos, arquitetos, escultores, pintores e designers gráficos, embora seja difícil entender como este valor esteja tão intrinsecamente ligado ao cérebro humano. Recentemente, um estudo com pessoas sem nenhum conhecimento em Crítica de Arte foi realizado com quadros do Renascimento originais e alterados fora da Medida de Ouro. Inconscientemente, as pessoas sabiam identificar quais obras estavam fora da Medida de Ouro, e portanto alteradas. A partir de leituras neurológicas, notaram-se certas reações no cérebro quando as pessoas enxergavam a Medida de Ouro nas obras. Assim, sabe-se que a Medida de Ouro, quando bem empregada, gera admiração inconsciente por parte do observador.
Mesmo com este novo conhecimento, os profissionais de Marketing ainda precisam compreender a maneira como poderão utilizar os dados neurológicos do consumidor. O lobo temporal do cliente ficou mais ativado, e aí? O que fazer com o produto? As análises da cabeça do consumidor são informações isoladas para o pesquisador e, nas mãos do profissional de marketing, serão somente mais um acessório dos atuais métodos de investigação.
A prosperidade do Neuromarketing também tende a esbarrar na questão ética. Hoje, a manipulação de mentes parece uma possibilidade distante – afinal, as ferramentas de compreensão e análise das reações cerebrais ainda são muito imaturas. Mas ninguém se arrisca a prever os limites das descobertas neurológicas nas próximas décadas. Não há, portanto, garantias de que o Neuromarketing seja apenas um inofensivo método de estudos dos hábitos de consumo. Usado em campanhas políticas, por exemplo, poderá ser pedra fundamental da manipulação do voto. Trabalhar em cima de estímulos que não são conscientes é eticamente condenável. A compra por impulso e a venda manipulatória geram o “remorso de compra”, o que significa a perda do cliente.
Mesmo que seja pouco provável a existência de uma ferramenta que deixe o ser humano tão vulnerável aos estímulos, não está descartada a descoberta de pequenas chaves de ignição de alguns instintos. De maneiras mais rudimentares, o marketing já está apertando nossos botões de compra. Empiricamente, é sabido que humor e corpos sadios ajudam na memorização de marcas. Também se sabe que alguns aromas e cores deixam as pessoas mais propensas a comprar.
O Neuromarketing é um salto quântico em relação às coisas que já foram descobertas a respeito do consumidor. Mas ainda está longe de produzir resultados práticos. Por enquanto, tudo o que se sabe é que a nova disciplina vai gerar mais informação – cuja utilidade é uma incógnita.
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FONTE: perdida
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