terça-feira, 8 de junho de 2010

Skinheads: quem são e o que pensam os integrantes deste polêmico grupo

Não é a primeira vez que casos de violência envolvendo os skinheads - em português, ?carecas? ? aparecem nas manchetes dos jornais. Sobram casos de brigas, pancadarias e xenofobia (aversão a pessoas e coisas estrangeiras) e faltam informações sobre o movimento. Será que todos os grupos skinheads do Brasil se apóiam nos mesmos valores? Afinal, o que é, o que pensa e como vive um skinhead? Para responder essas e outras perguntas, o iGirl conversou com o professor de inglês Tubarão, 32 anos de idade e 16 de movimento skinhead. Mesmo disposto a contar mais sobre o movimento, atitude que considera fundamental para mudar a imagem que todos fazem dos skinheads, Tubarão prefere não se identificar. Sua intenção é ?promover o movimento?, e não se promover.



Ao longo da conversa, o professor se esforçou para mostrar que a origem skinhead passa longe das idéias neonazistas. Ele reclama da falta de informação no próprio movimento sobre o que é ser um skinhead, e reconhece que faz parte de uma minoria consciente dentro do grupo. Sobre os últimos incidentes envolvendo os skinheads (os meninos do trem de Mogi e o assassinato de um homossexual na Praça da República, São Paulo, em fevereiro de 2000), Tubarão diz: ?Pessoas como eu se queimam por causa de energúmenos como eles?.



Para começar, qual a origem do movimento skinhead?

O movimento skinhead apareceu na Jamaica, em 1969. Eram pessoas reunidas em torno da música (ska, reggae e rock steasy). No Brasil, sua história teve origem nos ideais nacionalistas. Já a minha ligação com os skinheads começou por meio da música. Ouvia o som que os skinheads do mundo todo ouviam e então comecei a estudar as letras e a história do movimento e fui me envolvendo.



E como você se envolveu com os skinheads?
Sou skinhead desde 87. Conhecia algumas pessoas no bairro em que morava que me indicaram um lugar onde me encontraria com outros skinheads. Fui a um encontro numa estação de metrô e aí comecei a andar com os Carecas do Subúrbio.



Você já era skinhead, mas não participava de nenhum grupo, certo? E por que resolveu entrar para os Carecas do Subúrbio?
Quando você é solitário, sua vida é mais difícil, principalmente na adolescência. Me associei aos Carecas do Subúrbio ? que formaram o primeiro grupo skinhead do Brasil - quando tinha 16 anos. Nessa idade é normal você querer pertencer a um grupo. Você procura se afirmar através desse grupo, se proteger, enfim, é a busca de identidade natural do ser humano. Hoje não sou mais Careca do Subúrbio, o grupo perdeu sua ideologia original, não é mais a mesma coisa.



O que mudou no grupo?

Quando eu falo que os Carecas do Subúrbio perderam sua identidade é porque muitos deles hoje se comportam como punks. São punks que rasparam os cabelos. Bebem e andam sujos como os punks, praticamente não sabem o que é mesmo ser um skinhead. Falta informação sobre o movimento entre eles mesmo. Acontece que há muitos carecas das antigas ainda no grupo, e eles poderiam ensinar para os mais novos, mas isso não acontece.



Explique então qual seria a ideologia original dos skinheads do Brasil.

A idéia do skinhead é ser um movimento apolítico, mas não somos anarquistas. Os três maiores grupos de skinheads no Brasil são os Carecas do Subúrbio, os Carecas do ABC e os White Power. Os Carecas do Subúrbio são nacionalistas, os Carecas do ABC são integralistas. Existe uma grande diferença entre integralista e nacionalista. O integralista segue as idéias do Plínio Salgado (político, intelectual e criador da Ação Integralista Brasileira, movimento ultra-patriota), que têm um caráter mais xenófobo (aversão a estrangeiros). Os nacionalistas não são xenófobos, nem são patriotas exacerbados.

Na internet, existe a página dos Carecas do Brasil, que é feita por um Careca do Subúrbio que escolheu usar o ?do Brasil? para abranger skinheads de outros lugares do país, universalizar o movimento. Os White Power, como o próprio nome diz, são xenófobos, são neonazistas. Eles são a coisa mais contraditória do mundo. Em nenhum outro lugar do mundo eles seriam chamados de skinheads, não tem nada a ver. Esse é um movimento que nasce contra os Black Panters (os Panteras Negras, grupo surgido nos anos 70, nos EUA, que lutava pelos direitos dos negros). A expressão White Power apareceu pela primeira vez numa música do Ian Stuart, vocalista da banda Skrewdriver. Essa música virou um ícone do movimento White Power.



Você quer dizer então que o movimento skinhead não está associado a idéias neonazistas? Então por que as pessoas costumam relacionar tanto essas duas coisas?

É muito simples: desde os anos 80 que a imprensa vem relacionando os skinheads com os movimentos neonazistas. Isso acontece porque grupos neonazistas europeus como o British Movement e Nacional Front têm angariado milhares de seguidores e, entre essas pessoas, encontram-se muitos skinheads. Além do que, esses grupos também mantêm a cabeça raspada. Ai, quando aparece a imagem de milhares de carecas segurando a suástica (símbolo nazista), você já sabe... Fica fácil para a imprensa vender a imagem de skinhead como neonazista. É uma piada relacionar essas coisas, mas infelizmente vende.



Explique melhor o que é ser um nacionalista, idéia essa pregada pelos Carecas do Subúrbio.

As pessoas têm uma imagem deturpada do que é ser nacionalista. Ser nacionalista não é pregar que o Brasil é só para brasileiros. O Brasil é para brasileiros e para todos aqueles que querem e podem produzir para o Brasil. Não importa se é um estrangeiro vivendo aqui, o importante é que a pessoa trabalhe para o Brasil, coopere, traga riquezas. O problema não é racial, é econômico. Somos contra empresas e pessoas que sugam nossas riquezas. Empresas que chegam no país, oferecem péssimos serviços e ainda levam nossa riqueza para seu país de origem.

Nacionalismo é como uma forma mais apaixonada de patriotismo. A gente não está contra ninguém, apenas exaltamos o que tem de bom no país, mas sem tapar os olhos para os problemas. Ser nacionalista é não ter aversão a nada, sem ser estúpido a ponto de achar o Brasil perfeito. Mas não posso achar que só porque o Brasil passa por um mau momento que ele não pode dar certo. Temos todas as riquezas necessárias para sermos auto-suficientes.



E na época em que você era envolvido com os Carecas do Subúrbio, como era sua vida? O que você costumava fazer?

Fui ativo até 93. A gente costumava se reunir em diferentes estações de metrô ou de trem, sempre nas noites de sábado, e ai definia o cronograma da semana, dos shows. O grupo costumava programar os shows, organizar a arrecadação de comida perecível, que era doada a comunidades carentes. O que é cult entre os skinheads é ir a shows de bandas nacionais e internacionais.



Você viu muitas brigas? Por que os skinheads brigam tanto?

Originalmente a idéia não era essa. Eu particularmente nunca tive nenhuma briga com nenhuma facção. Havia mais confronto com os White Powers, mas esse grupo acabou oficialmente entre 92 e 93, com a criação do GRADE (Grupo de Repressão aos Delitos de Intolerância). Eles (os White Power) abusaram, ficaram populares, ai já viu. Ainda há muitos integrantes, mas não com a mesma organização de antes.



Quando você faz uma pesquisa na internet sobre skinheads, o que mais aparece são notícias sobre violência...

O movimento skinhead ficou com esse estigma porque é esse lado da violência que vende mais, coisa de imprensa marrom. Em 92 fui ao Programa Livre (extinto programa da TV Cultura comandado pelo apresentador Serginho Groisman), mas ninguém se interessa pelas características do movimento além da violência. E violência entre gangues sempre existiu. As fases de confrontos acabaram em 90. As brigas aconteciam, mas nada tão chocante como agora. Acredito que é a situação sócio-econômica do país que está levando a isso. As pessoas estão estressadas, sem perspectivas de melhorar num país com renda tão baixa. E uma das soluções é extravasar pela violência. A violência é também uma condição inerente ao ser humano, tanto que atinge outras camadas sociais, gente com dinheiro. O homem é violento.



Você concorda com a idéia de que o movimento skinhead é um movimento violento?
Falo por mim, Tubarão. A origem skinhead é a gangue. É um movimento de gangue, e gangues são violentas geralmente. Bom, eu acho que em certas ocasiões é preciso agir com violência. Mas falo por mim, essa é a minha idéia.



E os punks? Por que odiá-los tanto?

De novo falo por mim: o punk é um inútil. É alguém que acredita em anarquia, o que é utópico. E eu não vivo de sonho. O punk é um coitado de um hippie que cortou o cabelo. Ele se droga, se prostitui, tudo em nome de uma liberdade que, na verdade, não passa de libertinagem. Os punks me incomodam. Se eu ajo com violência? A violência pode ou não acontecer, ninguém a procura, não é uma causa, é um efeito. Um efeito colateral.



Você segue alguma religião?
O ser humano tem necessidade de uma crença, mas não de uma religião. Religião é manipulação, e ninguém aqui é massa de manobra. Eu creio em Deus acima de todas as coisas, Ele antes de tudo sempre, mas não sigo nenhuma religião.



E quais são os principais valores de um skinhead?

A família como a célula-mãe da sociedade, o pilar de tudo. Já o Estado é uma parte importante, cabe a ele definir as leis que devemos seguir. As pessoas precisam ser enquadradas. Eu luto por um país mais justo para todos, sem exceções. Justiça social, distribuição de renda, são essas coisas que desejo pro meu país. No fim, a gente quer o que todo mundo quer.



Existem bandas skinheads no Brasil?

Sim, a Bandeira de Combate ? que é uma banda nordestina que prega o nacionalismo - a Vírus 27... Há também as bandas que não existem mais, mas continuam sendo grandes referências, como a Histeria e os Patriotas. Essa banda nasceu no subúrbio, vem dos Carecas do Subúrbio mesmo. Já entre as internacionais, é importante citar o Defmond Dekkir (ska); os clássico Judge Dread; 04 Skin, Cockstarrer e Toy Dools.



Um skinhead é facilmente reconhecido por seu visual. Como se veste um skinhead original?

Com botas militares ou militarizadas, calças que vão desde a Levi?s 501 à calças militares, camufladas, verdes. Camisa pólo já esteve em voga muito tempo, assim como costeletas. Esse é o visual tradicional, aquele que você vê em fotos dos anos 70.



E porque manter os cabelos sempre raspados?

O próprio movimento se define como skinhead. Ele nasceu na Jamaica, onde os homens ou têm os cabelos compridos ou muito curtos. E cabelos raspados são higiênicos, de boa aparência.



Você tem o visual de um típico skinhead?

Sim, sou o mais ?paloso?: uso costeletas, sou careca, tenho várias tatuagens do movimento, sempre estou com roupa militar.



E sofre alguma discriminação por isso?

Não, nunca. Como, graças a Deus, sou uma pessoa informada e consciente, qualquer pessoa que vier tentar discutir comigo, em 10 minutos de conversa, desiste da discussão.



Levando em consideração o fato de que ser skinhead originalmente não tem nada a ver com neonazismo, o que você acha que deve ser feito para dissociar essas duas coisas? Por que então não se fazer um movimento para mudar essa imagem?

É muito simples: eu dependo de gente como você, que tem o poder de levar informação para muitas outras pessoas. Precisamos de mais apoio da mídia, de gente que dê espaço para que possamos falar sobre os reais valores do movimento skinhead. E ninguém aparentemente está a fim de abrir esse espaço.



E outros tipos de divulgação não são interessantes? Quando se faz uma busca na internet, só se encontra sites que falam sobre os casos de violência envolvendo skinheads...

Mas então você está fazendo a busca errada. Vários sites falam sobre os verdadeiros valores skinheads. Procure sites de banda, sites de ska, sites que contam a história skinhead original.... Seria interessante reunir as pessoas mais articuladas, aqueles que se interessam em mudar a imagem do movimento, para discutir mais sobre tudo isso.



Mas você concorda que essas pessoas mais articuladas e envolvidas com as idéias originais dos skinheads são uma minoria dentro do movimento?
Essa é uma pergunta capciosa, mas é uma minoria sim, infelizmente. É uma infelicidade termos poucas pessoas informadas e instruídas dentro do movimento. Informação tem, mas as pessoas parecem não se interessar.



Você acredita que é preciso que mais gente informada apareça na mídia para falar sobre o movimento, então por que prefere se identificar como Tubarão?

Porque minha idéia é promover o movimento, e não me promover. Não busco a minha popularidade, quero apenas que as pessoas saibam o que é ser skinhead e passem a respeitar mais, só isso.



E o caso dos rapazes no trem de Mogi? O que você tem a dizer sobre isso?

Eu diria que duas crianças foram assustadas e acabaram pulando do trem porque outras três crianças desinformadas causaram essa fatalidade. Foi uma fatalidade. Eles não têm base para nada. Um se declarou ex-careca, o outro se diz simpatizante de skinhead. Simpatizante não existe! São três garotos que pegaram uma bandeira e estragaram tudo.



Depois de um episódio como esse e o da Praça da República (quando um grupo de skinheads assassinou um rapaz homossexual, em fevereiro de 2000), a imagem do skinhead fica ainda pior...

Acaba tudo. Se existia uma imagem ruim com o ocorrido na República, então... E o pior é que são pessoas como eu que se queimam por causa de energúmenos como eles. Fica impossível melhorar a imagem, limpar a barra.

Um comentário:

  1. Ele diz que é diferente, mas quando pergunta sobre a violência ele responde que a violência é uma consequência. mas a violência não é uma consequencia, pelo contrário, pode ser ação e reação, nunca uma consequencia. A violência é uma causa de outros tantos problemas. Ele diz que não tem preconceitos, mas tem com os punks, aliás ele se mostra conhecedor da subcultura punk, sendo que desde os 16 anos ele é skinhead. Então, como ele pode se dizer conhecedor de causa? Sou gótica, amo meu país, mas não sou hipócrita a ponto de usar uma ideologia como desculpa para me pintar de boazinha como esse homem aí fez.

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